Pelotão 28 - Capítulo Dezessete





Abri os olhos com preguiça e fiquei olhando um tempo para o teto. Estava fadigada e por mais que dormisse, não conseguiria descansar. Apesar de ter dormido pouco, coisa que percebi assim que vi a luz tímida que entrava pelo cobogó deixando claro que ainda era noite. Havia dormido pouco, afinal. Engatinhei pelo pequeno colchonete camuflado até um caixote que havia sido posto alí como "criado mudo". Peguei meu relógio de pulso e vi que eram 03:13 am. Aproveitei e coloquei o relógio no pulso, levantei e vesti uma muda de roupa limpa, calcei o coturno e deixei meus cabelos soltos. Fechei o blusão camuflado ao sentir uma leve brisa passar pelo cobogó e imaginei que lá fora estaria ventando.

Abri a porta do "meu quarto" com sutileza e vi um soldado sentado no chão em frente ao meu quarto, provavelmente ele estava "de guarda". Preferi deixá-lo dormindo alí, aqueles primeiros dias haviam sido terríveis para todos e era justo um descanso. Sorrateiramente, segui até a ala onde estavam os feridos (já que meu quarto ficava no mesmo andar) e ao abrir a porta, vi que estava escuro, todos dormiam tranquilamente. Suspirei aliviada por ver a tranquilidade. Fechei a porta e voltei a caminhar pelo corredor vendo um soldado aqui e ali, sentado no chão duro, dormindo. Segui até o final do corredor e comecei a subir uma escada quase totalmente destruída.

Dois lances de escadas e cheguei em uma sala ampla, com parte do dedo destruído e parte inteira, dando uma visão do imenso céu negro e estrelado. Era uma noite muito bonita, não sendo pelos sons de tiros e explosões ao longe. O chão do local estava coberto por cascalhos, com vestígios de uma recém destruição. Entre concretos quebrados e objetos largados num ato de desespero, segui até próximo da parede no final da sala, onde o teto havia sido destruído deixando o céu aparente. A parede estava parcialmente destruída, o que também dava uma visão do local onde estávamos e também permitia que o vento circulasse no local. Uma espécie de bairro, algo meio deserto, ou algo parecido, não dava para saber muito já que estava tudo destruído.

Sentei no chão, próximo a parede onde estava destruído e fiquei olhando para a cidade, para a negritude que era tudo à minha frente. Fechei os olhos e respirei fundo sentindo o vento gélido tocar meu rosto e balançar meus cabelos suavemente. Apesar do som dos tiros e explosões, alí era calmo, agradável, me trazia uma certa paz. Mantive os olhos fechados enquanto o vento gelado tocava minhas bochechas quentes. Aquilo me levou para quando eu tinha sete anos e sentava na varanda de casa, sentindo as gotas da primeira chuva de inverno e meus pais enlouqueciam porque eu sempre adoecia. Ainda agora, sou capaz de ouvir meu pai gritar meu nome...

- Sakura?

Meu nome ecoou pelo local, como se meu sonho estivesse se materializando, mas em vez do grito alto do meu pai, meu nome soou grave e baixo, quase como num sussurro suave. Abri os olhos lentamente e virei o corpo para trás, vendo o Capitão Uzumaki parado à porta, me olhando com o cenho franzido. Ele olhou ao redor em uma análise rápida, aproveitei para analisá-lo também. Vestia sua habitual roupa camuflada, mas essa parecia limpa, recém trocada. O fuzil estava na mão esquerda e o dedo no gatilho, mas após olhar ao redor, ele pareceu perceber que estava tudo bem e soltou a mesma, deixando-a pendurada na bandoleira.

- Capitão... - fiz um meneio com a cabeça para que ele se aproximasse.


- A Doutora não deveria estar aqui fora. É perigoso. - para de pé ao meu lado olhando para frente.

- Discordo. - voltei a olhar para frente enquanto aproximava os joelhos do peito e abraçava minhas pernas - Aqui é tranquilo.

- Você deveria estar descansando. - sua voz saiu pesada e eu ergui a cabeça para poder olhá-lo. Assim que o fiz, ele baixou a cabeça para me olhar também.

- Não há como descansar aqui, Capitão, mas estou relaxada. - lancei um pequeno sorriso - E você... não descansa?

- Já descansei o bastante. - estreitou os olhos em minha direção.

- Hun... - estreitei os olhos para ele também, mas acabei desistindo - Sente-se, Capitão.

- Estou bem de pé. Obrigado.

- Ora, deixe de ser turrão e sente. - voltei a olhar para frente - É incomodo tê-lo de pé ao meu lado.

- Por quê?

- Você é gigante, Capitão. - estalei a língua - Parece que estou ao lado de um gigante desse jeito.

- A culpa não é minha se a Doutora é pequena demais. - sua voz saiu divertida. Elevei os olhos para ter certeza de que ele estava me zoando.

- Não sou pequena demais, como falei, você é um gigante. - fiz um gesto com a mão - Agora, sente-se!

- Me dando ordens, Doutora?

- Meu Deus do céu, criatura! - olhei para ele novamente e me surpreendi. Um pequeno sorriso de canto desenhava seus lábios - Você tá me provocando.

- Desculpe. - sussurrou enquanto sentava ao meu lado. As pernas dele ficaram afastadas e os joelhos dobrados. Ele apoiou os antebraços nos joelhos e ficou olhando para a frente - Não é sempre que consigo tirar alguém do sério.

- Pelo visto me tornei seu mais novo brinquedo. - reviro os olhos ainda olhando para frente.

- Não brinco há muito tempo. - murmura para si.

Preferi não indagar o que aquilo significava. Me mantive calada olhando para frente. O vento que trazia a noite era agradável, como um roçar suave entre peles quentes... Apesar de frio.  Fecho os olhos novamente  respiro fundo enquanto o Capitão se mantinha calado. Ficamos em silêncio apenas apreciando a paisagem e os barulhos emitidos pela guerra. Como era estranho tudo aquilo, a paz do local mesmo com os barulhos. Incrivelmente, estar alí, sentada ao lado dele, me deixava tranquila, algo meio protetor, não sei exatamente, mas me fazia acreditar em algo melhor.


- No que está pensando, Capitão? - murmurei olhando para o céu escuro.

- Em quando você vai surtar.

- Porque eu surtaria? - viro o rosto para ele, mas não conseguia ver sua expressão já que ele olhava para o outro lado.

- Estamos em uma guerra, Doutora. Uma pessoa que nunca esteve em um lugar como esse, que está vivendo tudo o que você está, vai surtar uma hora ou outra.

- Eu não vou. - murmuro. - Sou mais forte do que imagina, Capitão.

- Eu sei. - ficou em silêncio por uns instante - Por isso estou pensando quando isso vai acontecer. - virou para mim e seus olhos azuis pareciam determinados.

- Por quê? - franzi o cenho.

- Porque não é possível que alguém tão pequeno seja tão forte, Doutora.

Abri a boca para falar, mas minha voz não saiu. Lancei ao Capitão um sorriso em agradecimento ao seu elogio involuntário e voltei a olhar para o céu. Ficamos em silêncio por mais um tempo enquanto nossa respiração era tudo o que denunciava estarmos vivos e presentes. Sem pensar muito, girei brevemente o corpo e afastei alguns cascalhos do chão e depois deitei, olhando para o céu. Cruzei minhas mãos sobre minha barriga enquanto me acomodava e percebi pelo canto do olho ele fazer o mesmo, deitando ao meu lado. Incrivelmente, havia uma cumplicidade entre nós dois. Algo havia mudado desde a primeira vez que o vi.

E isso era muito bom.

- Então, você nunca ri? - perguntei baixo enquanto olhava para o céu escuro.

- Como sorrir em uma guerra, Doutora? - eu não conseguia enxergá-lo já que o braço estava em frente ao rosto, mas podia sentir o peso em sua voz.

- Bom… é possível sorrir em qualquer lugar, desde que haja motivos.

- Você consegue ouvir isso? - ficou em silêncio e tudo o que eu ouvia eram tiros e explosões. - Isso é o som de vidas se perdendo. Inimigos ou não, esses filhos da puta têm família… Nossos companheiros também estão morrendo. Como sorrir quando se sabe de tudo isso e quando não se sabe se estaremos vivos daqui a dois minutos?

Ficamos em silêncio por um tempo. Eu queria poder ter resposta para aquilo, mas não tinha. Alí, no escuro, sob o céu estrelado e com os sons de guerra ao fundo, tudo o que eu conseguia pensar era em como uma pessoa consegue viver assim. Porque existia guerra? Ódio? Mortes? Eu conseguia ouvir sua respiração pesada ao meu lado, conseguia ver seu perfil e aquilo bastava. Tateando, procurei sua mão e a encontrei segurando o fuzil na altura da barriga. Assim que meus dedos tocaram sua mão, eu senti a respiração dele falhar, mas não me importei, deslizei minha mão sobre a sua, retirando-a brevemente da arma e a segurando. Entrelacei nossos dedos e apertei sua mão grande com a minha.

- Você está quente. - sussurrei.

- O que… O que tem isso? - ele pigarreou.

- Já se passaram dois minutos e você está quente, isso significa que estamos vivos. - virei a cabeça para o lado na intenção de olhar para ele e tudo o que encontrei foram dois brilhos azuis em minha direção - Eu acho que há motivos para sorrir sim.

Ele ficou em silêncio. Seus olhos brilhavam e tremulavam em minha direção. Eu não sabia o que se passava na cabeça dele, mas sabia que era algo bom já que ele respirava tranquilo. Talvez ele tenha entendido minha fala, talvez não, mas ele apertou minha mão em resposta e soltou um suspiro pesado enquanto continuava me olhando. A mão dele soltou a minha lentamente e subiu em direção ao meu rosto. Em vez de me tocar com a mão, ele encostou o dedo indicador em meu queixo de forma carinhosa. Só quando a ponta do dedo indicador dele deslizou pelo meu maxilar, seguindo a linha de meu rosto que percebi que estávamos deitados próximos. Minha respiração ficou irregular e algo em meu peito agitou quando os olhos azuis desceram para minha boca.

Involuntariamente ofeguei de forma discreta, mas seus olhos capturaram o movimento de meus lábios e ele acabou entreabrindo os dele também, enquanto passava a língua entre os próprios lábios. Em algum momento, o mundo deixou de existir e havia apenas nós dois e um sentimento que crescia timidamente, brotando como um botão de rosa, de forma suave, discreta, pegando seu espaço sem ser notada.

- Capitão!? - Uma voz soou longe e nós nos sobressaltamos sentando de uma vez só. Em questão de segundos, ele estava de pé, virado para a porta enquanto eu permaneci sentada, olhando para a frente, sentindo meu rosto formigar por todo o lugar por onde seu dedo passeou.

- Sim, 02? - sua voz estava rouca.

- Ah! - ouvi passos - Ai estão vocês vocês... Capitão Inuzuka está chamando, ele quer falar sobre uns planos de ação.

- Tudo bem, 02. Estamos indo. Obrigado.

- Permissão para me retirar, Senhor.

- Permissão concedida, soldado.


Escuto os passos do soldado enquanto ele se distanciava e então tudo volta a ficar em silêncio. Resolvi que era melhor ir logo fazer o tal plano e deixar o que havia acontecido para depois. Estava numa guerra e a aproximação do Uzumaki era a última coisa com a qual precisava me preocupar... Ou ocupar meus pensamentos. Levanto e ao virar, vejo que ele ainda olhava para a porta com as mãos em torno do fuzil. Passo as mãos em minha roupa para ajeitá-la e passo pelo Capitão em silêncio. Não preciso olhar para trás para saber que ele estava me seguindo, afinal, seus passos eram pesados... e próximos.



Notas Finais:

Obrigada, Evaaaaaaaa... Betou lindamente *-*




Comentários

  1. Minha vontade me matar o 02 com o fuzil só n é maior q a do Uzumaki. Certeza!
    Que momento lindo q eles passaram, foi realmente magico. Assim como seria o beijo.
    Mas que porra cara! Tô inconsolável agora
    Esperenado o próximo!

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    Respostas
    1. Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk...

      Ele até deixou o fuzil em punho xD

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  2. filho duma eguaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa, dei um soco na mesa que odio desse 02

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