Reencontros - Capítulo 2

Várias meninas estavam na sala de convivência e até acenaram aqui e alí para mim. Os corredores também estavam. Quando cheguei em frente a porta do meu quarto, respirei fundo e enfiei a chave na fechadura. Minhas mãos suavam e meu coração pulsava forte me fazendo cogitar a ideia de pedir para a Tenten verificar minha frequência cardíaca, mas quando girei a chave, a fechadura e abri a porta, percebi que não seria preciso ela verificar. Minha frequência havia parado.

Sentada na poltrona próximo a porta – e agora me olhando – estava a Hinata.

Como se meus pés pesassem uma tonelada, entrei no quarto e fechei a porta ainda olhando para ela. Seus cabelos estavam curtos – batiam nos ombros – vestia uma calça jeans e um casaco escuro. Continuava tão linda como sempre foi, mas sua aparência era... preocupada. Ela me acompanhava com os olhos e eu ignorei seu olhar e passei a olhar para a Tenten que me olhava nervosa. Segui até minha cama e sentei na beirada dela sem tirar os olhos da Tenten e a mesma já mordia o lábio inferior em um nervosismo palpável.

- Saky...

- Não. – A corto.

- Saky, por favor...

- Não, Tenten. – pego meu celular e começo a mexer aleatório.

- É a Ino. – escuto a voz da Hinata soar baixa.

Continuei olhando para o celular enquanto o silêncio no quarto se fazia esmagador. Claro que eu queria ignorar o fato de uma das minhas “ex” melhores amiga estar alí depois de tanto tempo, claro que eu queria correr e abraçá-la, matar a saudade que me consumia, mas e o orgulho ferido?

Mas eu não conseguia ignorar. Por mais que eu tentasse... Eu não conseguia. Com um suspiro derrotado, olho para a Hinata.

- O que houve? – deixo o celular de lado e a Tenten se senta na cadeira da mesinha de estudos.

- Ela... ela e o Gaara terminaram. – respira fundo de um jeito nervoso.

- Ah. Ela e o Gaara acabaram? – ergo as sobrancelhas e balanço a cabeça de forma positiva – Tá. Ok. Ela supera. Fim de relacionamento não é tudo. – passo as mãos em meus cabelos, fazendo um coque. – Vai por mim. No inicio parece que o mundo vai acabar, mas depois... Pá! - bato uma mão na outra - Ela supera.

- Ela está grávida. – Solta de uma vez.

Fico olhando para a Hinata tentando descobrir se aquilo era alguma piada, mas pelo jeito como remexia as mãos, como mordia os lábios, como batia os pés no chão, como seus olhos estavam trêmulos e seu peito subia e descia desesperado aquilo não era brincadeira nem de longe. Ela estava muito nervosa e se eu a conhecia muito bem, tinha algo mais... Algo bem pior.

- O que mais?

- É que... O Gaara ainda não sabe e...

- Pera... primeiro de tudo: O que EU tenho a ver com isso? – cruzo os braços. – Ele é o pai, não eu.

- Sakura, escuta, por favor. – Tenten pede já perdendo a paciência.

- Ok. Desembucha. – resmungo.

- Do início, Hinata, pela fé! – Tenten estava realmente perdendo a paciência.

- Tá. – respira fundo – É o seguinte: Semana passada, a Ino e o Gaara tiveram uma discussão daquelas e acabaram. Isso foi logo no início da semana. No final de semana, teve a festa da irmandade de natação e como a Ino tinha ajudado na decoração e tudo o mais, ela foi para a festa. Nessa festa uma garota começou a se jogar em cima do Gaara e a Ino com raiva ficou com um garoto do time de basquete na frente do Gaara. Foi só um beijo, nada além disso, mas foi o suficiente para o Gaara não querer ver a Ino nem pintada de ouro e cravejada de diamantes na frente dele.

- Eles são duas crianças. – reviro os olhos.

- Eles sempre foram, Sakura. Explosivos, impulsivos, mas se amam...

- Prr... – reviro os olhos novamente - Amor... sei...

- Enfim... – respira fundo – Ha três dias atrás a Ino percebeu que a menstruação estava atrasada e quando fez as contas teve noção de que estava treze dias em atraso, então fomos na farmácia e ela comprou um teste, o fez ontem e deu positivo.

- E o pai é o Gaara.

-É claro que é. A Ino nunca teve nada com ninguém desde que eles dois começaram, e com o garoto do time foi só um beijo, apenas um, mas ela está com medo porque é óbvio que o Gaara não vai acreditar. E agora ela está desesperada sem saber o que fazer e bem... – suspira, me olhando já com os olhos cheios de lágrimas – eu também não sei.

- E é por isso que ela veio aqui, Saky. – Tenten finaliza. – Somos as amigas delas. A Ino precisa de nós. Mesmo você negando isso para tudo e todos você sabe no fundo de seu coração disso, você sabe.

- Ela tem que se resolver com o Gaara, eu sinto muito, Hinata, mas eu não posso fazer nada. – levanto respirando fundo.

- Saky... – a voz da Hinata sai chorosa.

- Sakura... – Tenten levanta e para em minha frente – Você diz que superou, que é tudo passado... Então vamos realmente deixar isso para trás. Já chega de castigar nossa amizade pelo que aconteceu. – ela segura meu rosto com suas mãos – Por favor, vamos voltar a ser aquele grupinho chato e idiota que costumávamos ser.

Fico olhando para a Tenten. Eu sentia falta sim daquele grupinho. Éramos uma família. Éramos nós quatro contra tudo e todos. Eu sentia falta dos risos, das brincadeiras, dos segredos... Ela tinha razão, havia passado, eu havia superado. Estava na hora de deixar aquilo para trás.

- Tudo bem. – suspiro.

- Eu sabia! – Sorrindo, a Tenten me abraça forte.

Retribuo seu abraço e quando nos separamos, olhamos para a Hinata que estava um pouco insegura, a chamo com a mão e com um sorriso enorme ela levanta e se junta em um abraço triplo, apertado e saudoso. Nos afastamos e eu vejo que elas estavam com os olhos cheios de lágrimas e eu acho que também estava, pois, minha vista estava embaçada.

- Então, como vai ser? – Tenten pergunta.

- Bem, primeiro vamos refazer o teste. Esses de farmácia costumam errar. Amanhã às 09:00, você pode levar ela no laboratório? – olho para a Hinata.

- Posso.

- Maravilha. Vou falar com o Kimimaro. Vamos fazer um beta rapidinho para ter a certeza e só então vamos tomar uma decisão.

- Saky... – ela me olha e suspira – Muito obrigada. Muito, muito obrigada mesmo. Você não sabe o quanto nos arrependemos de tudo.

- Deixa pra lá, Hina. Agora vamos nos concentrar na Ino. Lembre de amanhã aparecer lá no laboratório.

- Ok.

Claro que nem tudo seria tão fácil assim, mas de agora em diante teríamos que dar um passo de cada vez. Nos despedimos da Hina e depois de um pouco de conversa minha com a Tenten decidimos dormir, afinal, amanhã seria um longo dia. Era só o que me faltava, a Ino estar grávida do Gaara. Eu sempre soube que aqueles dois lá, fogo e pólvora juntos não daria muito certo e ai está , a explosão feita. O sono veio tão rápido quanto possível e eu apaguei sem nem lembrar se sonhei.

- - 

Quase corria pelos corredores do prédio de medicina enquanto desviava de um e outro aluno. Dobro em um corredor e escorrego quase caindo, mas deslizo com toda a maestria de uma bailarina e consigo manter o equilíbrio, voltando a correr novamente e finalmente abro a porta da sala de aula prática e entro. Alguns alunos estavam ali terminando de se arrumarem. Escolho um armário qualquer e jogo minha mochila dentro pegando meu jaleco e vestindo rápido. Faço um cóque nos cabelos prendendo-os firme com um elástico, pego também meu estetoscópio e coloco no bolso do jaleco bem como um bloquinho de notas e caneta.

Finalmente termino de me arrumar e sigo para a segunda porta do laboratório, abrindo-a. Era uma porta dupla como a de um hospital e os alunos já estavam alí, faltava apenas eu e outra aluna que eu não conhecia. A professora de cirurgia geral estava lá preparando nosso protótipo para a aula e quando nos viu entrar franziu o cenho com desgosto. Engoli em seco por isso. Eu nunca havia me atrasado para uma aula. Parabéns Sakura, seu primeiro atraso!

Em cima de uma mesa cirúrgica estava um cadáver para ela, porém na sala tinha outras mesas e em cada mesa um cadáver para cada aluno. Fazendo um sinal com a mão, ela nos indicou para irmos para nossos lugares. Seguimos. Meu cadáver era um homem pardo de estatura alta, cabelos escuros, morto por bala.

- Muito bem. Hoje vamos fazer uma apendicectomia. Seu paciente já está sob anestesia geral, entubado e pronto para o inicio da operação. Lembrem de usar lâmina 10 para abertura e depois cauterizador.  Vamos começar?

Assentimos. Colocamos as luvas, preparamos a iluminação e então pegamos o bisturi e começamos com o corte, todos os movimentos eram feitos com cuidado e sempre observados pela professora. Ela também fazia o procedimento e nós observavamos o que ela fazia através de uma tv que havia sido colocada, assim, poderíamos ter uma ideia melhor. Pegamos o cauterizador e começamos a fazer a incisão. Chegou o momento de colocar o dedo dentro do paciente e com cuidado para não queimar a luva, fomos cortando as camadas de pele e gordura. Pego três afastadores e coloco na incisão do meu paciente para me dar mais visibilidade e continuo com o cauterizador. Finalmente acho o apêndice. Com a ajuda de uma pinça, pego uma gaze e limpo um pouco o local para melhorar a visibilidade e então olho para a tela da professora e volto a olhar para meu paciente.

- Muito bem. Vamos fazer a incisão agora. Usem o prendedor de cada lado e então vocês vão isolar o apêndice. Peguem a linha e lembrem de fazer isso direito, não quero saber desse paciente parecendo o Frankenstein depois. Nós precisos, firmes e bonitos. Agora liberem uma parte e cortem a linha. Outra incisão e vamos passar a linha novamente, e... cauteriza... – enquanto falava ela ía fazendo e claro, nós alunos também fazíamos. – Olha que coisa linda... – os olhos dela sobem para os monitores dos alunos – Pelo amor de Deus, Konnor... Onde aprendeu a costurar assim? Com sua avó?! – Os olhos de águia da professora o fuzilam por cima dos óclinhos – Refaça isso. Já! – O coitado do garoto confirma nervoso e ela volta os olhos para o cadáver dela – Estamos realmente perdidos. Perdidos... Vamos voltar... Agora, só mais uma costura... Certifiquem-se de ter a plena certeza de que está tudo muito bem fechado para este paciente não ter nenhuma hemorragia. Cauterizem e cortem a linha. – os olhos sobem para as tela – Isso, agora suturem. Soro... Sucção... Gaze... Solução... Segunda sutura... Gaze... Terceira e última sutura e... Pronto!

Quando ela termina, leva alguns segundos/minutos para que todos tenham terminado, mas quando finalmente todos terminam – até o coitado do Konnor – ela passa de mesa em mesa analisando os trabalhos e aqueles que ela não havia gostado mandava refazer. Ainda bem que foram poucos – e eu estava fora desses poucos- o que me deixou muito feliz. Segundo a própria, minhas mãos eram firmes, o que me fez ter um corte limpo e uma boa sutura.

Olhei para o relógio na parede e ví que já era 09:01. Com um susto enorme, retiro as luvas jogando-as no lixo e saio da sala seguindo para o vestiário. Retiro o jaleco. Pego minha bolsa e coloco-o dentro dela e então volto a correr pelos corredores dessa vez saindo do prédio e indo para o prédio dos laboratórios.

Um garoto que andava de skate quase me atropela na calçada e eu só não o chamei de santo enquanto tentava desenganchar minha mochila da mochila dele. Finalmente voltei a correr rumo o prédio desejado e quando avistei a Ino e a Hinata em frente a ele respirei fundo. A Tenten também estava lá e as três me olharam de um jeito curioso. Ofegante, descabelada e agora suada, paro em frente a ela com as mãos nos joelhos.

- Oi. – sinto minha garganta seca.

- Menina... O que... houve? – Tenten pergunta baixo.

- Aula prática com direito a elogios e uma professora lenta.

- Nossa... Ah... – Os olhos da Hina vão de mim para a Ino – Bem... Hun... Sakura... Ino...

- Saky... – a voz da loira sai baixa.

- Deixa de ser idiota e vem cá. – puxo a loira para um abraço.

Ela me abraça desajeitada e acaba dando um soluço alto caindo no choro. Sorrio com aquilo e a abraço forte. Era bom ter minha amiga de volta. Quando finalmente nos afastados vejo o rosto dela cheio de lágrimas. Ela funga e passa as mãos no rosto, limpando-o. Faço o mesmo ao perceber que eu também havia chorado.

- Acho melhor entrarmos, o Kimimaro deve estar me xingando horrores pela demora.

Elas apenas concordaram. Entramos no prédio dos laboratórios. Era um prédio pequeno de dois andares. Alí ficava todos os laboratórios possíveis para todos os cursos na área de saúde. Os estudantes de farmácia usavam muito aquilo, bem como biomedicina e genética. O Kimimaro, era estudante de genética e vez ou outra trocávamos favores, o que era bem comum. Segui para o laboratório que ele costumava estudar -o L7- que ficava no primeiro andar. Seguimos para lá e quando chegamos em frente a porta, dei duas batidas e a porta abriu, revelando o garoto branquelo (quase albino) com uma cara fechada e sobrancelha erguida.

- Isso são horas? – cruza os braços.

- Eu já disse que te amo? – faço cara de inocente.

- Só quando quer se aproveitar de mim. – murmura e então abre um sorriso enorme, abrindo os braços.

- Valeu, Kimi. – o abraço forte – É caso de vida ou morte.

- Vamos entrar. – ele dá um passo para o lado abrindo um pouco mais a porta e todas entramos.

O laboratório era bem comum, cheio de tubos de ensaio, vidrarias, prateleiras, e um monte de coisas. Ele vestia um jaleco e nos encaminhou para um canto. Sentamos lado a lado e ele sentou à nossa frente, ficamos separados por um balcão. A Ino contorcia as mãos nervosa e a Hinata estava do mesmo jeito.

- É o seguinte, minha amiga aqui está precisando de um beta tipo: URGENTE. – indico a Ino.

- Hun... – olha pra ela de relance – O resultado sai...

- Hoje, depois do almoço. – corto ele.

- Saky... – murmura.

- Kimi, por favor. – suspiro – É tipo... muito urgente. – me inclino sobre o balcão e seguro seu braço – É algo muito sério. Por favor. Por favor. Por favor.

- Sakura Haruno, você não tem jeito. – suspira derrotado. – Tá legal... Mas olha, só vou fazer isso porque você ponteou minha cabeça quando apareci bêbado no seu dormitório de madrugada, sangrando. – levanta, indo até uma prateleira e eu o ví pegando seringa, agulha...

- Você vai fazer isso pela nossa amizade, seu idiota. – resmungo, ouvindo-o gargalhar.

- Ok. Ok. – volta para aonde estávamos e coloca uma bandeja pequena com seringa, garrote, algodão e band aid dentro em cima do balcão. – Estica o braço, por favor. – pede para a Ino enquanto calçava as luvas.

A loira estende o braço e ele logo pega o garrote e e envolve no braço dela, passa o algodão e procura a veia. Quando acha, pega a seringa e com toda a maestria ele coleta o sangue. A tensão no local era tão grande que quando ele retirou a agulha de dentro do braço da Ino, ouviu-se um suspiro coletivo. O Kimimaro até olhou para todas com as sobrancelhas erguidas. Ele colocou a seringa dentro da bandeja e tapou o furo com o bandaid.

- Deixa o braço esticado por três minutos. – tira as luvas – Assim que o resultado sair eu te mando uma mensagem, Saky.

- Valeu, Kimimaro.

Sob toda a tensão de saber se a Ino estava realmente grávida ou não deixamos o prédio dos laboratórios. A Hinata e a Ino voltaram para o campus delas e eu segui com a Tenten para o nosso. Teríamos aula juntas antes do almoço. Se eu prestei atenção na aula? Quase nenhuma. A única coisa que passava pela minha cabeça era o fato de minha amiga estar grávida do ex namorado e de ter feito a burrada de ter ficado com outro cara na frente dele. Mas ok. O Gaara não seria tão idiota a ponto de duvidar não é? Claro que não seria.

Agora eles teriam uma responsabilidade e sem falar que o futuro deles seria bem complicado, um filho é um filho. Eles vão ter que amadurecer juntos e isso vai ser bem complicado, mas se souberam fazer um filho vão ter que saber cuidar também. É a lei da vida. Ninguém mandou sair com o fogo por ai queimando descontroladamente. Finalmente a aula acabou e eu fui para a lanchonete com a Ten. Lá encontramos a Shion que já estava ficando descabelada com nossa sumida. – de menos de 24h. Contamos rapidamente a situação e ela quase caiu da cadeira e morreu engasgada, mas no fim das contas, sobreviveu. Já estava terminando meu almoço quando meu celular tocou e eu ví que era um email do Kimimaro. Olhei para as meninas e elas me olharam curiosas.

- É do Kimimaro.

- Iaê? – Tenten ergue as sobrancelhas.

- Bem... – destravo a tela e abro o e-mail. Era o resultado. – Positivo.