Gypsy - Fagulha 35

 

Sentiu um leve formigar na bochecha e fez careta, tentando afastar aquele formigamento, mas então ele tornou a acontecer. Era frio e levemente áspero. Resmungou e abriu lentamente os olhos, encontrando um edredom. Franziu o cenho e piscou os olhos, subindo o olhar pelo tecido grosso, encontrando um pescoço magro e ao subir o olhar um pouco mais, encontrou os olhos negros levemente abertos.

- Bom dia. - a voz dele saiu bastante grave e seca.

- Bom dia. - arrumou-se na cama, passando as mãos nos cabelos, olhando-o logo em seguida - Como você está?

- Ótimo. - sussurrou, passando a língua entre os lábios. Diferente de Sakura, Itachi apenas tentou se arrumar na cama, mas não tinha forças, então desistiu e permaneceu do jeito que tava.

Ela suspirou, percebendo que ele estava pior. Apesar do brilho nos olhos e o sorriso que não abandonava os lábios, Itachi estava muito pior.

Com um bolo na garganta, Sakura engatinhou na cama e arrumou as almofadas de um jeito que desse para o Uchiha ficar sentado, depois o ajudou a sentar. Itachi estava muito leve, os cabelos desgrenhado, olheiras extremamente profundas...

- Vou trazer seu desjejum. - fez menção de levantar, mas ele a segurou pelo pulso.

- Fica. - pediu baixo e começou a tossir.

Rapidamente, Sakura segurou nas costas dele, dando apoio enquanto com a outra mão, pegava um lencinho que tinha ao lado da cama, entregando-o ao moreno. Itachi apoiou o lenço na boca e quando terminou de tossir, puxou o ar com força para dentro dos pulmões e eles chiaram. Ele estava com muita dificuldade para respirar. Quando afastou o pano, tinha sangue nele.

Sakura mordeu o lábio para esconder a dor que sentiu com aquela cena.

Itachi suspirou pesadamente, embrulhando o lenço.

A Haruno pegou o lenço e o colocou de volta no criado mudo, tornando a ajeitar Itachi na cama.

- Você precisa se alimentar. - pediu num gemido baixo - Vou até a cozinha, pego algo e volto.

- Tenho medo que não volte. - tentou respirar fundo, mas o peito chiou novamente - Arre!

Alguém bateu à porta e Sakura não se preocupou em responder ao moreno. Apenas levantou e caminhou até a mesma, abrindo-a, dando de cara com Sasuke e Shisui. Os dois a olharam brevemente e então menearam a cabeça.

- Bom dia, Sakura. - cumprimentaram juntos.

- Bom dia. - deu um passo para o lado permitindo a entrada dos irmãos - Que bom que chegaram, esse Gadjô teimoso não está me permitindo ir até a cozinha pegar sua comida!

- Não se preocupe com isso. - Shisui sorriu para a Haruno, olhando logo em seguida para o irmão - Já imaginei que ele não permitiria que se afastasse, então pedi para prepararem algo e trazer para cá.

- Mesmo morrendo o Itachi não deixa de ser turrão. - Sasuke resmungou e sentou na beirada da cama do irmão - Como está hoje?

- Me sinto... melhor... - tentou soar animado.

A verdade é que os ânimos de Itachi realmente estava melhor. Ter Sakura consigo o deixava bem de espírito, apesar de seu corpo já não estar se aguentando mais. Aproveitando que os irmãos estavam ali, ela foi até o banheiro e lavou o rosto, esfregando-o várias vezes, depois, encarou o próprio reflexo e suspirou, fechando brevemente os olhos.

Que situação complicada aquela. Ainda com os olhos fechados, fez uma oração rápida aos astros, pedindo para que tivesse força para mais um dia e para que Itachi conseguisse resistir.

Agora, não queria perdê-lo.

Ouviu batidas na porta do quarto e imaginando ser o café da manhã do Uchiha, passou as mãos nos cabelos, tentando arrumá-los e então saiu do banheiro vendo que três empregadas estavam ali, fora os irmãos.

- Eu não quero. - Itachi reclamou, bufando.

- Precisa se alimentar para ficar forte. - Sasuke reclamou - Não pode se entregar assim, meu irmão!

- Só fico pior quando como. - ele resmungou.

- Porque vomita pouco depois. - Shisui revirou os olhos.

Enquanto as empregadas arrumavam duas bandejas: uma visivelmente para Itachi e outra para Sakura, os outros três trocaram olhares. Sakura sentou ao lado de Itachi na beirada da cama e arrumou os lençóis sobre ele, vendo o moreno levemente arrepiado. Ela ergueu uma mão e tocou na testa do homem, sentindo a pele quente.

- Está com febre. - suspirou - Vou fazer uma mistura de ervas que vai ajudar a baixar rapidinho.

- Não quero que... - respirou fundo, fazendo careta - ... que se afaste de mim.

- Mas você não tem querer, Gadjô. - estreitou os olhos para ele e quando uma empregada se aproximou com a bandeja dele, a Haruno pegou, apoiando-a na cama. Ela analisou a comida do Uchiha: Mingau, suco de laranja, uvas, pão, pasta de aveia e meia maçã.

- Isso é hor...rivel. - sussurrou o moreno, fechando brevemente os olhos.

- Você não tem querer, já falei! - Sakura pegou o mingau e com uma colher, ofereceu ao moreno. Relutante, ele abriu a boca e comeu o mingau fazendo careta.

- Está sem sal.

- Colocamos sal no mingau, senhor. - uma empregada informou, inclinando o corpo levemente para frente - Fizemos conforme seu último pedido.

- Não está! - ele estava sem paciência - Esse... esse sal... - tossiu, levando uma mão ao peito. O moreno ficou ofegante e Sakura retirou a bandeja de perto dele, auxiliando com a tosse.

A crise dessa vez foi mais forte e algumas gotículas de sangue voaram sobre o lençol branco da cama. Todos ficaram espantados com a quantidade de sangue que ele cuspiu. Sentindo o coração ficar miúdo, Sakura arrancou o lençol, jogando-o no chão e prontamente pegou outro lencinho ao lado da cama, entregando-o ao moreno que limpou o queixo que estava melado.

Itachi jogou a cabeça para trás, fechando os olhos enquanto sentia o peito queimar. Sakura trocou olhares com Shisui e Sasuke. Os dois, estavam com os olhos esbugalhados, paralisados, vendo o irmão sofrer. Era muito, muito doloroso para eles.

Ficaram em total silêncio esperando o Uchiha do meio se acalmar e quando ele pareceu estar estável, a Haruno suspirou, pegando sutilmente na mão dele. Mesmo com os olhos fechados, Itachi reconheceu o toque e apertou levemente a mão dela. De forma delicada, a jovem cigana ergueu a outra mão e deslizou pela testa do moreno, retirando os fios rebeldes que haviam ido para o rosto dele durante a tosse.

Itachi estava mais febril.

- Preciso fazer seu chá.

- Não... - ele sussurrou - Não há mais nada...

- Há sim. - respirou fundo - Me deixe cuidar de você.

- Prolongar pra quê? - abriu os olhos, olhando para ela.

- Não quero que morra. - mordiscou o lábio, sentindo os olhos marejarem - Se não quer comer...

- Não... - balançou a cabeça, fazendo careta - É horrível...

- Não seja tão dramático. - brincou, sorrindo - Façamos o seguinte: eu como junto com você.

- Sakura... - ele resmungou.

- Vamos lá! - pegou o prato com o mingau e levou uma colher à boca, mas ao provar da comida, ela fez careta - Allah!

- Eu disse. - arqueou as sobrancelhas para ela.

Sakura olhou para as empregadas, fazendo careta.

- Isso está horrível. O que botaram aqui?

- Apenas grãos, água, um pouco de pimenta e sal. - uma delas informou.

- Não, não! - a Haruno ficou de pé olhando a bandeja - Não tem não!

- Senhora... eu mesma preparei. - a empregada anunciou - Cada ingrediente...

Consternada, a jovem cigana ficou olhando para a empregada e então pegou o mingau, levando outra colher à boca, dessa vez, ela degustou um pouco mais, tentando reconhecer os ingredientes. Conhecia muito bem sabores. Como cigana, possuía um paladar de dar inveja, afinal, degustava de várias iguarias naturais.

Tinha algo errado com aquele mingau. O sabor não batia com o informado pela mulher.

A Haruno balançou a cabeça de forma negativa, olhando para Itachi. O moreno a olhava com o cenho franzido sem entender absolutamente nada.

Ele estava com olheiras profundas, bastante magro, os cabelos ressecados, quebradiços e caindo bastante, além é claro, do sangue que estava cuspindo.

E foi então que um alerta surgiu na mente da mulher. Lentamente, ela foi esbugalhando os olhos, reconhecendo aqueles sinais: envenenamento!

Mas Sasuke havia dito que um médico tinha descartado aquela possibilidade.

Então, como...?

Olhou para Sasuke e Shisui que a olhavam tão confusos quanto Itachi. Era notório que a mente da cigana estava trabalhando a todo o vapor enquanto ela pensava. Rapidamente, a mulher desceu da cama, caminhando até os dois irmãos.

- Shisui, você fica aqui ao lado do Itachi...

- Sakura...? - Itachi chamou, mas ela ignorou.

- Ninguém, absolutamente ninguém pode se aproximar dele. - informou.

- O que está acontecendo? - o mais velho dos Uchiha quis saber.

- Se alguém se aproximar, seja lá quem for, mate! Fui clara?

- Totalmente. - respondeu, sentando ao lado da cama do irmão.

- Sakura? - mais uma vez, Itachi chamou, mas fora ignorado.

Ela olhou para Sasuke.

- Você vem comigo. - depois, ela olhou para as mulheres - Vocês três também.

As mulheres trocaram olhares e caminharam na direção da Haruno. Sasuke não fez perguntas, apenas meneou a cabeça. Quando estavam à porta, a Haruno olhou para Itachi dando uma última analisada nele.

- Você está proibido de morrer!

Ele arqueou as sobrancelhas e ela se retirou do quarto junto com os outros.

Já no corredor, Sakura mandou as mulheres irem à frente enquanto ela e Sasuke foram atrás. Enquanto passavam pelos corredores, Sasuke olhou para Sakura em um questionamento mudo sobre o que estava acontecendo e ela balbuciou: veneno.

O moreno esbugalhou os olhos e olhou para as três empregadas a frente. Uma ira tomou conta do Uchiha mais novo e ele fez menção de pegar a adaga que carregava consigo, mas a Haruno segurou no braço dele, balançando a cabeça de forma negativa.

Dobraram em outro corredor e ela viu quatro guardas. A mulher fez sinais para os homens e Sasuke entendeu. Assim que passaram pelos guardas, o moreno fez sinal para que os guardas os acompanhassem e assim eles fizeram, seguindo todos para a cozinha do palácio.

Quando chegaram no local, todas as empregadas presentes paralisaram, afinal, nenhum dos sheikes haviam estado ali antes. Todas fizeram uma mesura e ficaram trocando olhares confusas. Sakura se aproximou daquela que fizera o mingau de Itachi, olhando-a com os olhos estreitos.

- Mostre-me os ingredientes.

A mulher apenas meneou a cabeça, recolhendo cada um, colocando-os sobre uma enorme mesa de madeira que era usada como apoio na cozinha. De forma metódica, a cigana se aproximou da mesa e começou a analisar primeiro os grãos. Um por um, provando cada um, cheirando, olhando... Depois foi a vez do sal: Himalaia, ela percebeu. Por isso Itachi não estava sentindo a comida salgar.

Por último, foi a pimenta. A Haruno cheirou, depois pegou um punhado e colocou na mão, analisando-o. Viu vários grãozinhos de muitas cores, mas uma chamou a atenção: azul.

Franzindo o cenho, ela aproximou os grãos dos olhos, analisando aquele micro grão azul.

Piscou os longos cílios e perdida na própria análise, tocou com a ponta da língua no grão e o degustou. Enquanto isso, todos na cozinha estavam em total silêncio, observando o que ela fazia, incluindo Sasuke que não tirava os olhos da Haruno.

Sakura fechou os olhos e respirou fundo, passando a ponta da língua pelo céu da boca, depois, Sakura prendeu a ponta da língua entre os dentes e deu uma pequena mordida. Todos esbugalharam os olhos achando a cigana louca, até mesmo Sasuke que abriu a boca para contestar, mas se calou quando viu ela levar a língua para dentro da boca, depois colocar a língua para fora e com os lábios apertar o local, fazendo mais sangue sair.

Ela olhou para o moreno e meneou a cabeça de forma positiva.

- Guardas! - ele chamou - Bloqueiem todas as saídas.

- Sim, senhor! - dois guardas informaram.

Na mesma hora, um burburinho começou dentro da cozinha e as mulheres começaram a ficar desesperadas. O que está acontecendo? Era a pergunta que mais se ouvia. Como na cozinha só haviam duas saídas, um dos guardas foi para uma e outro guarda para a outra. O moreno se aproximou da cigana.

- Tem certeza? - perguntou baixo.

Ela colocou a língua para fora, mostrando que ainda sangrava.

- Comi do mingau dele e provei dessa pimenta. - informou - É warfarina. Tenho certeza. Itachi não para de cuspir sangue, os cabelos fracos são consequência do sangue instável.

- Mas o médico...

- Dependendo da forma que é administrada, ela pode ser indetectável. - o cortou, olhando ao redor - Alguém aqui está envenenando o Sheik aos poucos.

- A cozinheira... - ele fez menção de virar, mas Sakura o segurou pelo pulso.

- Não é ela. - balançou a cabeça.

- Mas ela que prepara...

- Acha que se fosse ela, ela nos traria direto para os ingredientes, estando o veneno, entre eles? - arqueou as sobrancelhas - Essa mulher está sendo usada e nem sabe.

- Mas quem?

Ambos olharam ao redor, analisando cada empregada. Todas pareciam assustadas com a situação, afinal, estavam proibidas de saírem dali. Instintivamente, a Haruno olhou para Sasuke.

- Preciso preparar algo para desintoxicar ele.

- Acha que consegue? - havia esperança na voz do moreno - Acha que consegue salvar meu irmão?

- E-eu não sei... - respondeu triste - Mas não posso deixar de tentar.

- Sakura... - segurou nas mãos da Haruno - Por favor... por favor...

- Coloque mais guardas aqui. Feche o palácio. Ninguém entra e ninguém sai. Ameace. Faça qualquer coisa, mas não deixe absolutamente ninguém entrar ou sair. Investigue.

- Não se preocupe. - meneou a cabeça, olhando para um guarda. O homem se aproximou do Uchiha - Fique aqui com a Sakura. Ninguém pode se aproximar dela, fui claro?

- Sim senhor. - o homem meneou a cabeça, olhando brevemente para a Haruno.

- Vou deixar ele com você. Se estão tentando matar meu irmão e você descobriu isso, vão tentar te matar também.

- Obrigada. - sussurrou.

- Vou cuidar do resto. - ele olhou para as empregadas - Quero todas na dispensa dos grãos! - informou e quando elas se viraram, ele apontou para a cozinheira - Você...

A mulher paralisou.

- Venha aqui. - e ela se aproximou, olhando para os pés - Quero que faça tudo o que a Sakura pedir.

- Sim, senhor.

- Ótimo. - ele olhou uma vez para o guarda, indicando a Haruno - Não tire os olhos dela.

E com isso, Sasuke saiu da cozinha, deixando Sakura ali com os quatro guardas e a cozinheira. No segundo seguinte, ela começou a pedir um monte de ervas para a mulher que prontamente foi até a dispensa dos temperos, buscar o que a Haruno havia pedido. Sakura começou a praticamente correr pela cozinha pegando coisas aqui e ali.

Agora, precisava correr contra o tempo para tentar salvar Itachi.